Revista MB Recomenda

Célia & Dino Barioni

Por Daniel Brazil - 11/06/2007

Ouvir Célia cantar é um privilégio de poucos. Embora esteja comemorando 35 anos de carreira, nunca estourou em rádios nem vendeu milhares de discos. Mas não há conhecedor da música brasileira, ouvinte, cantor ou músico, que não admire a maravilhosa intérprete de timbre quente, respiração perfeita e emoção destilada em dose certa a cada canção.

Desde 2000, quando lançou o melhor songbook de canções de Paulinho da Viola de todos os tempos (que os fãs de Tereza Cristina ouçam e comparem), junto ao grande cantor Zé Luiz Mazziotti (Pra Fugir da Saudade, Jam Music), que os fãs aguardavam novo recital.

E ela se renova, expande horizontes, ousa em Faço No Tempo Soar Minha Sílaba (Lua Music, 2007). Suas escolhas temáticas às vezes flertam perigosamente com o brega, e acabam dando um nó na cabeça do ouvinte: como aquela música tão chão pode soar tão céu? Célia canta canções de cabaré (ou de puteiro, pra usar termos bem brasileiros) com a elegância de uma Bessie Smith ou Billie Holliday, polindo e revelando delícias faiscantes.

O parceiro da vez é o violonista Dino Barioni, responsável também pelos arranjos. O disco conta com participações de instrumentistas como Dominguinhos e Quinteto Preto e Branco, além das vozes de Zélia Duncan, Lucinha Lins e Beth Carvalho.

Envolvente em Última Forma (Baden Powell/ Paulo César Pinheiro), dolorida na genial fusão Mãe, Eu Juro/ Sem Açúcar (Adoniran/ Chico Buarque), amorosa em Pressentimento (Elton Medeiros/ Herminio Bello de Carvalho), dramática em Cabaré (João Bosco/ Aldir Blanc) e Tango de Nancy (Edu Lobo/ Chico Buarque) e maliciosa na surpreendente versão de Disritmia (Martinho da Vila), Célia mostra como uma verdadeira intérprete pode surpreender seu público sem quebrar o encanto do envolvimento.

De quebra, registra a mais bela versão de Serra da Boa Esperança (Lamartine Babo), tantas vezes maltratada por impertinências sertanejas. E recupera Gonzaguinha (Geraldinos e Arquibaldos), Gonzagão (Dúvida), Malfitano (Mente ao Meu Coração) e Mirabeau (Quase). Abre com Caetano (Muito Romântico) e fecha com Dalla e Palotino (Gesù Bambino) na versão potencializada por Chico Buarque.

Um disco quase perfeito. Só não é melhor que o anterior porque, convenhamos: cantar só Paulinho da Viola, acompanhada pelo Mazziotti, é covardia!