Perfil

Nei Lopes

Por Luís Pimentel - 24/07/2003

Escrevi n´OPASQUIM21, uma vez: "quando eu crescer, quero ser Nei Lopes". Continuo querendo. Eu e a torcida do Flamengo (apesar de que, me parece, Nei comete a insensatez – que o Aldir não me leia – de ser vascaíno). Nei Lopes é sonho de consumo e inspiração permanente de quem gosta da música brasileira. E que, portanto, lê seus livros, indispensáveis, e acompanha sua bela carreira de compositor.

"É isso aí. É Irajá". Refrão de um samba seu. Samba que traz uns versos que me deixam com o peito apertado, sempre que re-escuto: "Saudade foi à sombra da jaqueira/Sentou na espreguiçadeira/E pegou o violão/Cantou a moda do caranguejo/Estendeu a mão prum beijo/E me deu opinião/Depois tomou um gole de abrideira/Foi sumindo na poeira/Para nunca mais voltar". É isso. Nei é mesmo de Irajá, bairro no subúrbio do Rio de Janeiro, onde o futuro grande artista nasceu em 1942.

Doutor Nei (o homem é bacharel, sim, pela Faculdade Nacional de Direito da antiga Universidade do Brasil). Só que, data-vênia, pendurou o diploma e foi fazer música. Nas escolas de samba, nas rodas, nos terreiros, em Irajá, em Vila Isabel, hoje pelo mundo inteiro. De coração franco, foi juntando parceiros pelos quatro cantos. Wilson Moreira, o queridíssimo Alicate, talvez seja o mais fiel e mais profícuo. Mas tem também João Nogueira, Cláudio Jorge, Zé Luiz do Império, Moacyr Luz e tantos outros que nem sei.

Vejam quantos discos gravados: A Arte Negra de Wilson Moreira & Nei Lopes, O Partido Muito Alto (também com Moreira), Negro Mesmo, Canto Banto, Sincopando o Breque e De Letra & Música. Participa de algumas antologias, alguns discos foram reunidos e regravados, e na voz de outros cantores tem um caminhão de obras-primas. Batalhador da música e em defesa do músico, é desde os anos oitenta diretor da AMAR- Sombrás (Associação de Músicos, Arranjadores e Regentes-Sociedade Musical Brasileira). Lá, entre outras providências, edita o maravilhoso informativo Jornal da AMAR, que quem não conhece deve procurar conhecer imediatamente (www.amar.art.br).

Nei Lopes é ainda pesquisador e escritor de responsa, com uma obra de referência, crítica ou orientação fundamental, tanto sobre a temática afro-brasileira quando sobre a MPB, passando pela ficção e a poesia. Confiram: O Samba, na realidade, Bantos, malês e identidade negra, O negro no Rio de Janeiro e sua tradição musical, Zé Kéti, o samba sem senhor, na coleção Perfis do Rio, Logunedé: santo menino que velho respeita, Dicionário Banto do Brasil, Incursões sobre a pele (Poesia) 171 Lapa-Irajá (crônicas) e Sambeabá, sambas e sambistas da nossa MPB (se é que não esqueci – devo ter esquecido – de outras obras).

Nei Lopes, com seu olhar atento, sorriso maroto e jeitão de menino sessentão e boa-praça, tem a cara do samba brasileiro: cesteira, brejeira, bonita de se ver. E de se ouvir.