Memória

Waldir Calmon, um pioneiro

Por Gerdal José de Paula - 26/08/2013

Mineiro de Rio Novo, nascido em 30 de janeiro de 1919, Waldir Calmon  foi expressão musical, no topo da carreira, nos anos 50, de um Rio de Janeiro bem menos populoso, romântico e ainda ameno. Tentou, a princípio, ao chegar à antiga capital da República, em 1936, a sorte como cantor, indicado pelo amigo Benedicto Lacerda para apresentações nas Rádios Guanabara e Transmissora, mas, pouco depois, trocaria acertadamente essa veleidade pelo piano, sendo dele, ainda como Waldir Gomes, o acompanhamento nesse instrumento da gravação original de Ataulfo Alves para "Leva Meu Samba", em 1941.Três anos depois, formou o seu primeiro conjunto, Gentlemen da Melodia, com o qual tocou na boate Meia-Noite, do Copacabana Palace; animou, a convite de Eva Todor e Luís Iglesias, intervalos de espetáculos nos Teatros Rival e Serrador e marcou presença no Cassino Atlântico, em Santos. De lá foi para São Paulo, onde se tornou atração da boate Marabá, regressando dessa capital, em 1947, para atuar na então recém-criada Night and Day, no Rio, quando os cassinos já estavam fechados em consequência do "choque de ordem" do governo Dutra. Oito anos mais tarde, deixando essa boate de neon cole-porteriano, criaria, no Leme, uma própria, referência das luas cariocas (motivadora do sacudido "Samba no Arpège", dele e do pernambucano Luiz Bandeira, e de uma de suas séries de elepês, "Uma Noite no Arpège - 1, 2 e 3") e rival de uma bem próxima, Drink, do também pianista Djalma Ferreira, situada nesse mesmo bairro praieiro que dá título a gostoso samba de Roberto Nascimento, Armando Cavalcante e Vítor Freire, gravado por Johnny Alf ("Leme, a capital da madrugada...")  Em 1968, veio o canto de cisne do Arpège, pelo qual passaram, entre outros artistas de renome, João Gilberto, Tom Jobim e Ary Barroso, onde Vinicius conheceu Baden Powell e, em 1966, Chico Buarque fizera um dos seus primeiros shows, "Meu Refrâo" (idealizado e produzido pelo ator e cineasta Hugo Carvana), ao lado de Odete Lara e do MPB4.

Waldir Calmon foi, nos anos 50, pioneiro na gravação de discos de 10 e 12 polegadas com faixas únicas de "pot-pourri" (em um dos lados das bolachas), ininterruptas, próprias para a animação de festas domiciliares, extensão em microssulco dos concorridos shows dançantes que fazia em boates, clubes e até mesmo bailes de formatura. Também ajudou, nesses idos, a difusão do solovox (teclado acoplado ao piano, precursor do sintetizador), tocando no primeiro deles a chegar ao Brasil. Ele, que gravou "Rock Around the Clock" em ritmo de samba, lançou, em 1956, pelo selo Rádio, o elepê "Samba, Alegria do Brasil", que virou marco da discografia nacional porque dele saiu o registro de "Na Cadência do Samba" (Que Bonito É!"), um gol de placa do supracitado Luiz Bandeira (que também passou pela Meia-Noite e seria "crooner" da Drink), inesquecível tema do futebol nas edições do cinejornal Canal 100, do "bon vivant" Carlinhos Niemeyer. Também marco da nossa discografia tornou-se outra das séries gravadas por Waldir Calmon, a Feito para Dançar - do primeiro ao duodécimo album -, ainda pelo selo Rádio, vendendo como banana na feira e mesclando destaques dos "hit parades" nacional e internacional. Trabalhando com pequenos conjuntos e grandes orquestras, de acordo com a solicitação do momento, ele teve em sua companhia grandes músicos, como os bateristas Édson Machado (que começou no Arpège) e Mílton Banana (que, antes de tocar com Waldir, era percussionista), o guitarrista Paulo Nunes e os percussionistas Rubens Bassini e Eddie Mandarino. Nos anos 70, passou pela churrascaria Roda-Viva, na Urca, e pelas cervejarias Bierklause, no Lido, e Canecão, em Botafogo, nesta por sete anos, com sua orquestra de baile, antes e depois do show principal. Bebia apenas água e refrigerante, mas fumava muito, morrendo de infarto do miocárdio em 11 de abril de 1982. Um músico que, segundo Sérgio Porto, impressionava pela técnica, pelo virtuosismo, pela versatilidade e pela capacidade de adaptação a todos os ritmos dançantes, "tão verdadeiro num mambo, numa guaracha ou num foxtrote".                           ..