Memória

Luiz Eça, um músico renovador

Por Gerdal José de Paula - 16/05/2013

"Luiz Eça é um músico excepcional. Um dos maiores do nosso tempo. Dois anos de estudo em Viena, aluno de Gulda, foi quase concertista. Depois, a rebeldia contra a mentalidade acadêmica, passou de Mozart para Gershwin e deste para Tom Jobim. A música popular brasileira moderna começava a tomar forma definida e Luiz foi um dos seus arquitetos." Assim se expressou o compositor Edu Lobo, na contracapa de um elepê gravado na Philips pelo Tamba Trio em 1966, acerca do pianista Luiz Eça (fotos abaixo), sintetizando deste movimentos de carreira até então.

Em meados da década anterior, antes mesmo da viagem à Áustria, Luiz Eça já se apresentava na noite carioca, substituindo ao piano Johnny Alf - que partira para Sampa para tocar na prestigiada Baiuca -, em um trio que, nas noites da boate Plaza, em Copacabana, completava-se com a guitarra de Paulo Ney e o contrabaixo de Ed Lincoln, ainda conhecido como Eduardo Lincoln. Depois, com a saida de Paulo Ney, essa formação se ampliaria com o acordeão de João Donato, as baquetas de Mílton Banana e o canto sussurrado de Claudette Soares, que, novata na MPB, por pouco tempo exerceria sua dignidade como princesa do baião, título nobiliárquico que Luiz Gonzaga informamente lhe providenciara. Amigo de Garoto, a cujo sítio em Areal (RJ), ao lado do de Radamés Gnatalli, ia com frequencia, Luiz Eça, retornando da cidade de Johann Strauss, gravou com Astor Silva, em 1961, na Odeon, um ótimo elepê, "Cada Qual Melhor", cevado por "standads" nacionais e norte-americanos, no qual à sua requintada formação teórico-clássica juntava-se o traquejo do grande e igualmente saudoso trombonista, iniciado na escola popular dos "dancings". O disco supralembrado do Tamba Trio, com arranjos e direção musical de Eça, além da regência do maestro potiguar Mário Tavares - da orquestra sinfônica do Teatro Municipal -, já contava com o baterista Ohana, em lugar do Hélcio Milito da constituição habitual, e, naturalmente, o baixo e a flauta de Bebeto Castilho.

Foi a convite de Maysa que Luiz Eça fez seu noviciado como arranjador, acertando em cheio em "O Barquinho", elepê-referência da bossa nova, gravado pela cantora. De volta à noite carioca, o pianista seria, anos depois, por longo período, figurinha fácil do Chiko`s Bar, na Lagoa, onde teve um encontro bem-humorado com o colega de teclado e ídolo norte-americano Bill Evans, jazzista que, com brios fustigados, veio ao Rio para aprender com o amigo carioca a harmonia correta de uma passagem de composição de Luiz Eça, uma falha em gravação que deste ensejara reparo noticiado em jornal. Outro pianista de renome internacional, o francês Michel Legrand, que também tocou com Luiz Eça no Chiko`s Bar, esteve no Rio, em 2004, para participar de tributo ao amigo talentoso, falecido em 1992, aos 56 anos, em CD intitulado "Homenagem a Luiz Eça". Bela evocação de um músico renovador que, embora quantitativamente parcimonioso como compositor, legou à posteridade temas impressionistas de muito "feeling", como "Imagem", "Melancolia" e "Dolphin" ("Daulphine"), este ainda com notável registro de outro pianista de mão cheia, Osmar Milito.