Memória

Billy Blanco: a banca de excelência da MPB

Por Gerdal J. Paula - 18/02/2014

"Lá vem ela num sorriso lindo, lindo/perguntar o que eu preciso/como vou indo/serve um lanche/e ainda pergunta se estou satisfeito/estou, mas quero tudo a que tenho direito/tanta graça, tanta arte/isso é miragem/pena que não faça parte da passagem/com essa flor a bordo/eu confesso então/que é bobagem medo de avião/é bobagem medo de avião..." Tema de um comercial da Vasp veiculado em 1976, na voz do cantor Dick Farney, que fora casado com uma dessas profissionais do ar, o sambossa "Aeromoça", de Billy Blanco (fotos abaixo), é, no conjunto da obra homogeneamente expressiva desse paraense, assim como "Camelô", "Nouveau-Riche", "A Banca do Distinto" e "Feiura Não É Nada", reflexo da sua capacidade notável de descrever tipos urbanos e fotografar ambientes e situações - "Estatuto de Boate" e "Estatuto de Gafieira" - em letras a que não faltam pitadas de ironia e mordacidade.
Hábil no uso a um só tempo crítico e gracioso da palavra, a serviço da sua aguda percepção dos fatos, William Blanco Abrunhosa Trindade, na certidão de nascimento, também bebeu da fonte idílica para criar, por exemplo, com Nilo Queiroz ("Encontro com a Saudade") e Baden Powell ("Samba Triste"), joias lapidares. Arquiteto diplomado pela mesma faculdade onde quase teria um desistente Tom Jobim, futuro parceiro, como colega de especialização, fez com o nosso maestro soberano, por exemplo, o samba-canção dialogado "Teresa da Praia", sob medida para as vozes de Dick Farney e Lúcio Alves.
Aparentemente sisudo no palco, entretendo, à maneira do pioneiro Buster Keaton no cinema norte-americano - isto é, sem sorrir - plateias com suas tiradas e histórias engraçadas, o patrimonial Billy sempre representou, na sua obra, um encontro especular da MPB com uma fração exemplar da melhor produção desta, especialmente no que esta tem de observação inteligente e irreverente da realidade do país. Costumava dizer, em uma de suas "boutades", que continuaria cantando e levando a carreira avante até onde a bengala o ajudasse, o que, infelizmente, já não é mais possível. Nascido na estação das frutas, em 8 de maio de 1924, Billy Blanco atravessaria, em breve, 90 outonos em sua vida, a maior parte dos quais neste cenário exaltado de montanha, sol e mar da sinfonia do seu Rio, que ficou - e ainda é - quatrocentão.