Homenagens

Roberto Paiva partiu em silêncio

Por Gerdal J. Paula - 23/09/2014

   Tão discretamente quanto conduziu sua carreira, faleceu, no último 31 de julho, aos 93 anos, o bem-falante cantor Roberto Paiva (fotos abaixo), um carioca da Rua Santa Luísa, situada em bairro recorrente na história do samba: Vila Isabel. Mesmo não sendo um artista badalado, ele, por sua interpretação correta e segura, atraiu para a voz encorpada, nos particulares anos dourados - coincidentes com os dourados da nossa música popular -, compositores de vulto, um dos quais, Geraldo Pereira, teve chance de lançar, em 1939, gravando deste o samba "Se Você Sair Chorando" (da parceria com Nelson Teixeira). Também lançaria, em 1953, a toada "Menino de Braçanã", de Luiz Vieira, então um acordeonista cantador brotando para o êxito autoral.

    O contato inicial com o microfone viria para Roberto Paiva na adolescência, quando, por acaso, numa gazeta em Niterói com colegas do Pedro II, se inscreveu, instado por eles, em um programa de calouros da Rádio Sociedade Fluminense, do qual souberam ao passar pela porta da emissora - concurso vencido por Roberto com a valsa "A Você", de Ataulfo Alves e Aldo Cabral. Pouco depois, em outra gazeta, vê Cyro Monteiro - que já conhecia -, na Rádio Mayrink Veiga, o qual o leva ao programa "Picolino", de Barbosa Júnior, em que aquele ginasiano conheceu Laurindo de Almeida e Romualdo Peixoto. o Nonô, autores presentes aos lados A e B do seu primeiro 78 rpm, em 1938: "O Último Samba", do violonista (feito em homenagem a Noel Rosa), e a valsa "Jardim de Flores Raras", do pianista (tio de Cyro e Cauby), com letra de Francisco Mattoso. Músicas a que deu canto, aos 17, com o uniforme do colégio, em estúdio da Odeon.

    Para burlar a restrição familiar - sobretudo a do pai, linha-dura, que o queria atuante na caserna -, o rapaz Helim Silveira Neves adotou a alcunha artística, sendo o Roberto inspirado por um galã de cinema em evidência na época - então vindo de navio para uns dias na Velhacap -, o norte-americano Robert Taylor, e o Paiva do sobrenome de parte da família. O pendor para o romantismo dos versos na canção, presente, por exemplo, no registro de outras valsas, não lhe subtrairia, no entanto, sucessos para a exaltação hedonista da folia, estourando, em 1941, com o samba de protesto "O Trem Atrasou", de Paquito, Estanislau Silva e Artur Vilarinho, e, em 1945, com a marcha "Tagarela", de Roberto Martins e Frazão.

    Na década seguinte, dois cultuados dez-polegadas o aguardavam como trampolins para a posteridade na MPB: no primeiro, em 1956, gravando no Rio como Wilson Baptista, dividiu com o paulista Francisco Egydio, gravando em Sampa como Noel Rosa, os títulos da famosa polêmica entre esses compositores (só meses depois do lançamento do elepê, por causa dele, Roberto e Egydio conheceram-se em pessoa em atração da tevê paulistana); no segundo, ainda em 1956, pela trilha de "Orfeu da Conceição", foi simplesmente, por indicação do produtor Aloysio de Oliveira, o primeiro a cantar "Se Todos Fossem Iguais a Você", entre outras compostas por Jobim e Vinicius para a peça. Se não lhe parecesse "quebrado" o ritmo de outro samba, que Geraldo Pereira, ao violão, numa noite em botequim do Rio, após umas canjibrinas, tentava lhe mostrar, não teria recusado, como o fez, "Falsa Baiana". Uma "ficha" caída tardiamente, um mês depois, para sua surpresa, quando, pelo rádio, tocando bastante, constatava, dessa vez, a primazia da gravação do amigo Cyro, seu padrinho artístico.