Homenagens

Nara Leão – 80 anos de nascimento

Por Alberto Buaiz Leite - 25/01/2022

     A música marcou profundamente sua vida, o violão foi seu grande companheiro e a suavidade e leveza marcaram o seu canto. Nunca buscou o sucesso, mas sua carreira fluiu em torno dele. Nossa homenageada chegou ao mundo como Nara Lofego Leão, em 19 de janeiro de 1942. Nasceu em Vitória, ES, e veio para o Rio de Janeiro, com a família, com um ano de vida. Foi morar em Copacabana, na Avenida Atlântica e lá viveu grande parte de sua vida.
     Aos 11 anos, ganhou de seu pai um violão e com 12 anos já tinha aulas com o violonista, compositor e cantor Patricio Teixeira, juntamente com Roberto Menescal, seu colega de colégio. Menescal era cinco anos mais velho do que ela e já convivia com alguns artistas da época, como Carlos Lyra e Ronaldo Bôscoli. Assim, Nara passou a conviver com eles e, em 1957, começaram a acontecer encontros em sua casa, reunindo cantores, compositores e músicos que viriam a criar o movimento da Bossa Nova. Luiz Eça, Sylvinha Telles, Oscar Castro Neves, Vinícius de Moraes, Tom Jobim, João Gilberto foram alguns dos que participaram destes encontros, além de Menescal, Lyra e Bôscoli, que tornou-se seu namorado. Nara era a mais nova do grupo. Não costumava cantar, mas gostava de acompanhar os presentes com seu violão, que tocava muito bem. Virou uma espécie de mascote do grupo e daí passou a ser chamada de musa da Bossa Nova.
     Em 1959 e 1960, o grupo fez várias apresentações em universidades, clubes e teatros. Apesar de não pensar em tornar-se cantora, até pela sua timidez, Nara esteve sempre presente nestes espetáculos, inclusive fora do Rio de Janeiro. Nos anos seguintes, ela e outros integrantes da Bossa Nova seguiram outro caminho musical. Nara aproximou-se de intelectuais de esquerda, do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC da UNE) e de cineastas do Cinema Novo, como Cacá Diegues, Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos e Rui Guerra. Esta aproximação deu um novo rumo ao seu canto. “Descobri um outro lado da vida e do mundo. Fiquei impressionada com coisas que descobri. Que havia fome, morro e pessoas pobres. Queria participar, denunciar, testemunhar.”, disse ela em entrevista.
      Em 1963, sua carreira ganhou um impulso. Em março, na boate Au Bom Gourmet, apresentou-se ao lado de Carlos Lyra e Vinicius de Moraes, no espetáculo “Pobre Menina Rica”, escrito pelos dois. Em agosto, iniciou a gravação de seu primeiro disco, lançado pela gravadora Elenco, em 1964. Aloisio de Oliveira, dono da gravadora, insistiu para que ela gravasse clássicos da Bossa Nova, mas a cantora não concordou e escolheu um repertório que abordasse questões sociais. Assim, ela gravou sambas de compositores mais populares, oriundos das escolas de samba, como Nelson Cavaquinho, Cartola, Elton Medeiros e Zé Keti e outras músicas de temática distinta da Bossa Nova, de compositores como Edu Lobo, Rui Guerra, Baden, Vinicius, Guarnieri e Carlos Lyra, entre outros. Neste mesmo ano, lançou seu segundo disco pela Philips, “Opinião”, seguindo o mesmo caminho do primeiro e participou do espetáculo, com o mesmo nome, em que ela atuou ao lado de Zé Keti e João do Vale. Em 1966, viveu um grande momento de sua carreira, ao participar do II Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, interpretando a Banda, de Chico Buarque, que foi vencedora do festival e impulsionou a carreira do compositor. Em 1969, já casada com Cacá Diegues, viajou para Paris, num autoexílio, onde permaneceu até 1971. Voltando ao Brasil prosseguiu sua carreira, sempre marcada pelo sucesso. Continuou lançando discos, fazendo apresentações pelo Brasil, mas também em Portugal, França e Japão. Participou de alguns filmes nacionais, cantando ou como atriz. Infelizmente sua carreira foi curta. Faleceu aos 47 anos, em 07 de junho de 1989, em consequência de um tumor no cérebro.
     Nara Leão foi uma artista completa. Teve uma ativa atuação política, colocando-se, publicamente, contra a ditadura militar, correndo o risco de ser presa. Divulgou a obra de inúmeros novos compositores e lançou artistas. Quando afastou-se, por motivos de saúde, do espetáculo “Opinião”, trouxe Maria Bethânia, na época com 18 anos, para substituí-la. Daí a declaração da cantora baiana: “Eu tenho heroínas na minha vida. Nara é uma delas. Nara foi a chave para o conto de fadas que Deus escreveu para mim”. Nara gravou 24 LPs e fez o que quis na música brasileira. Gravou o que gostava, nunca aceitando imposições de produtores e de gravadoras. Cantou o que seu público queria ouvir. “Eu quero cantar músicas que ajudem a gente a ser mais brasileiro, que faça todo mundo se sentir mais livre.”, dizia ela. A Música Popular Brasileira ficou mais rica com sua presença. Sem ela o nosso cancioneiro não teria o mesmo encanto.