Homenagens

Miltinho, o cantor do tempo certo

Por Gerdal J. Paula - 09/09/2014


 "Você, mulher, que já viveu/que já sofreu/não minta/um triste adeus/nos olhos teus/a gente vê, mulher de trinta..." ("Mulher de Trinta", de Luís Antônio); "Foi assim/a lâmpada apagou/a vista escureceu/um beijo, então, se deu/e veio a ânsia louca, incontida do amor..."("Meu Nome É Ninguém", de Luiz Reis e Haroldo Barbosa); "Peguei o Zé/de copo na mão/tentando afogar a Conceição/no bar, quem é triste vira herói/engana a cabeça/o coração não dói..." ("Zé de Conceição", de João Roberto Kelly); "Luminosa manhã/pra que tanta luz?/dá-me um pouco de céu/mas não tanto azul..." ("Canção da Manhã Feliz", de Luiz Reis e Haroldo Barbosa); "Você errou/quando olhou pra mim/uma esperança fez nascer em mim..." (Recado", de Djalma Ferreira e Luís Antônio). Esses, entre outros, são sucessos que, sobretudo nos anos 60, firmaram o cantor carioca Miltinho (fotos abaixo), no panorama da MPB de então, com uma interpretação diferente, anasalada, toda sua, em que brincava com o ritmo e a divisão.

Seu primeiro elepê solo, "Um Novo Astro", data de 1960, em que gravou a bem rodada "Mulher de Trinta", mas, antes disso, provara da antiga e eficaz receita do canto popular: a atuação como "crooner", de 1950 a 1957, da Orquestra Tabajara e, pouco depois, do conjunto Milionários do Ritmo, liderado pelo organista Djalma Ferreira. Também fizera parte de memoráveis conjuntos vocais, como Namorados da Lua, Anjos do Inferno e Quatro Ases e um Curinga, cantando e batendo pandeiro, como hoje faz o talentoso Pedrinho Miranda, ex-integrante do Grupo Semente.

"Filho direto do melhor sincopado brasileiro", como escreveu o colunista de economia e bandolinista Luís Nassif, Miltinho é tema do curta-metragem "No Tempo de Miltinho", de André Weller (pianista, artista gráfico e ex-integrante do conjunto Família Roitman), exibido há cinco anos pelo festival É Tudo Verdade, no Rio e em São Paulo. Feito com recursos da Petrobras, após aprovação em concurso público da estatal, mostra raras imagens de arquivo, sendo merecido e bem-vindo reconhecimento. Flores colhidas ainda em vida por Miltinho, que, no feriado de anteontem, 7 de setembro, aos 86 anos, deu o seu último suspiro. "Um cantor que sempre transitou entre a modernidade e a tradição, que foi popular sem deixar de ser sofisticado", de acordo com a arguta observação do jornalista e escritor Rodrigo Faour.