Homenagens

Carlos Cachaça, 120 anos de nascimento

Por Alberto Buaiz Leite - 27/08/2022

“Ele se foi/ Mas cumpriu o seu papel/ Foi parceiro de Cartola/ E amigo de Noel/ Foi um bam bam bam da escola/ Se tornou um menestrel”. Estes versos são do samba “Menestrel”, de Tantinho da Mangueira e Ratinho, e homenageiam o grande compositor mangueirense Carlos Cachaça. O sambista veio ao mundo como Carlos Moreira de Castro. Nasceu em 03 de agosto de 1902, no Rio de janeiro, e viveu quase toda a sua vida, no morro da Mangueira. Era de família pobre e seu pai abandonou a esposa quando Carlos ainda era criança. Sua mãe, com dificuldade para criar seis filhos, o entregou ao padrinho, o português Tomás Martins, dono de vários barracos no morro, que o criou. Assim, conseguiu realizar seus estudos até o curso ginasial e, em 1926, passou a trabalhar na Estrada de Ferro Central do Brasil, onde ficou até a aposentadoria, em 1965. Apesar da dedicação ao samba e à bebida, nunca deixou de cumprir suas obrigações no emprego.
     Ainda criança, Carlos já participava dos blocos carnavalescos locais e dos ranchos. Aos 16 anos, já era pandeirista do conjunto de Elói Antero Dias, o Mano Elói, pai de santo e músico que muito contribuiu para a difusão do samba no Rio de Janeiro. O nome artístico surgiu aos 17 anos e tem sua razão de ser. Ele realmente gostava e bebia muita cachaça e isto durou algumas décadas, mas nunca fez besteira por causa da bebida. Dona Menininha, irmã de Dona Zica e esposa do sambista, até levava na brincadeira o apelido. Ela contava que quando o procuravam e ele não estava em casa, ela dizia: “Está na rua fazendo jus ao nome”.
     Carlos Cachaça teve sua vida artística impulsionada, na década de 1920. Em 1922, compôs sua primeira música intitulada “Não me Deixaste Ir ao Samba” que foi, mais tarde, gravada pelo próprio autor. Nesta época, já era amigo de Cartola que se tornou seu parceiro mais constante e, com ele compôs seus maiores sucessos. Em 1926, com Cartola fundou o Bloco dos Arengueiros, que deu origem à Estação Primeira de Mangueira, em 1928. Vários sambas com os quais a escola desfilou foram da dupla Carlos Cachaça e Cartola. Em 1936, teve um samba seu gravado, pela primeira vez, por Araci de Almeida. Foi “Não Quero Mais Amar A Ninguém” em parceria com Cartola e Zé da Zilda, lançado em 78 RPM. Esta música fez um enorme sucesso e teve mais de vinte gravações. Só voltou a ter músicas gravadas, a partir de década de 1960. Suas outras composições de grande sucesso foram: “Alvorada”, parceria com Cartola e Herminio Bello de Carvalho, “Ciência E Arte”, com Cartola, “Quem Me Vê Sorrindo”, com Cartola e “Tempos Idos”, também com Cartola. Gravou um único disco solo, em 1976, lançado pela Continental e relançado, em 1995, pela Warner Music. Teve participação em vários outros discos, lançados nas décadas de 1970, 1980 e 1990. Mas merecia ter feito mais sucesso e gravado muita coisa que acabou ficando inédita.
     Nosso homenageado teve uma vida longa e sempre dedicada à família, ao trabalho, à música, à Mangueira e aos amigos. Foi um líder no morro, muito estimado e respeitado. Em depoimento no livro “Pioneiros do Samba” de Arthur de Oliveira Filho, o compositor Babaú da Mangueira declarou: “ Quando o Carlos tinha vinte anos, eu tinha oito. Eu não era ninguém perto dele, mas já assistia o Carlos ensinando samba ao nosso saudoso Cartola, explicando, porque o Cartola não fazia nada sem consultar o Carlos. Ele foi sempre nosso menestrel. Tem uma capacidade extraordinária. Tem uma educação fora de série. Nunca brigou com ninguém. Nunca discutiu com ninguém”.
     Carlos Cachaça morreu no Rio de Janeiro, aos 97 anos, em 16 de agosto de 1999, de pneumonia. Foi e ainda é uma referência na música brasileira e na história das escolas de samba. Deve ser lembrado sempre como alguém que respeitou e valorizou seu povo e a cultura de seu país.