Homenagens

Antonio Vieira, mestre maranhense

Por Daniel Brazil - 20/04/2009

Ai, meu Deus, se eu pudesse,
Eu abria um buraco,
Metia os pés dentro, criava raiz.
Virava coqueiro, trepava em mim mesmo,
Colhia meus cocos, meus frutos, feliz
.”

Corria o ano de 1997 quando a voz brejeira da maranhense Rita Ribeiro espalhou pelas ondas do rádio estes versos inusitados. Cocada, a alegre canção, tratou de popularizar em todo o Brasil o nome de seu autor, Antônio Vieira, que também assinou “Tem Quem Queira” no mesmo disco. A surpresa era saber que o compositor tinha 77 anos, na época.

No Maranhão ele não era novidade. Muitos já conheciam e admiravam “Mestre Vieira”, autor de mais de 300 músicas, compositor cujo talento chegou a lhe valer o apelido de Cartola maranhense. Compôs sambas, toadas, boleros, forrós e carimbós, incorporando naturalmente a rica tradição popular do de seu estado natal. Compôs sua primeira música, Mulata Bonita, com 16 anos, em 1936.

A estréia oficial em disco ocorreu pelas mãos de outro jovem maranhense, Zeca Baleiro, que produziu o CD Ao Vivo em 2002, gravado no Teatro Arthur Azevedo, com a participação de Sivuca, Elza Soares, Célia Maria e, claro, Rita Ribeiro. Trazia Mulata Bonita e mais um punhado de delícias musicais que atestavam seu grande talento.

Como compor não dava dinheiro, Vieira se virou exercendo inúmeras profissões, de sargento do Exército a vendedor de telefones. Pesquisador de cultura popular, escreveu com Lopes Bogéa o livro Pregões de São Luís. Em 2002 o projeto foi transformado em CD pela gravadora Eldorado, com o mesmo nome. Vieira criou músicas que recriavam os pregões de doceiras, garrafeiros, amoladores, sorveteiros, carvoeiros e mascates, compondo um painel de vozes urbanas que hoje não são mais ouvidas.

Vieira também teve ligação com o choro, tocando pandeiro em várias formações. Foi um dos fundadores do Tira-Teima, o mais antigo regional de São Luís. Na fase mais recente, acompanhava o grupo Urubu Malandro. “Minha terra tem tambor de crioula, a tua não tem”, proclamava ele, orgulhoso das tradições maranhenses. Em 2008, teve ainda o prazer de ouvir sua “Na Cabecinha da Dora” na voz de três das melhores cantoras do país: Rita Ribeiro, Tereza Cristina e Jussara Silveira, no CD Três Meninas do Brasil.

Antonio Vieira morreu no dia 7 de abril, aos 88 anos. A sua obra, em grande parte ainda desconhecida, faz por merecer o apelido de “Mestre” com que era chamado. Fica aos jovens músicos maranhenses a tarefa de preservar e divulgar o valioso acervo deixado pelo grande compositor, autor desses versos inesquecíveis:

Portanto não bota fora
a tua alegria brejeira
se você não quer, tem quem queira.
Vai viver a tua vida
que ela é breve e passageira
se você não quer, tem quem queira!