Especial

Um Homem de Moral (Vanzolini no Cinema)

Por Daniel Brazil - 29/05/2009

O cineasta Ricardo Dias está lançando seu último filme, Um Homem de Moral. O enfocado é Paulo Vanzolini, maior compositor paulista e um dos grandes da música popular brasileira. Cheio de participações especiais, como Paulinho da Viola, Chico Buarque, Inezita Barroso, Martinho da Vila, Miúcha, Adoniran Barbosa, Elton Medeiros, Paulinho Nogueira, Virgínia Rosa e Ana Bernardo, entre outros, o filme recebeu aplausos nas mostras onde foi exibido.

A Revista Música Brasileira conversou com o documentarista, que é formado pela USP, com mestrado pela New York University, e tem um inusitado ponto em comum com Vanzolini: É biólogo de formação. Doutor Paulo é formado em medicina pela USP, e tem doutorado em biologia pela Universidade de Harvard.

RMB - Como surgiu teu envolvimento com Paulo Vanzolini? Ouvi dizer que vem lá de trás...

Ricardo Dias - Sim, eu era menino. Conheci o Vanzolini no começo dos anos 60, na usina de Jupiá, no rio Paraná. Meu pai foi o diretor de construção da obra e eu encontrei o Vanzolini lá, fazendo o estudo do impacto ambiental da obra.

Depois, nos anos 70, o encontrei na universidade. Tive aulas com ele quando estudei Biologia na USP.

Mais tarde o encontrei novamente em meados dos anos 80 quando eu dirigi o programa Globo Ciência, junto com o Aurélio Michiles. Desta época nasceu o projeto de um filme sobre o rio Amazonas, No rio das amazonas, que eu fiz em 95. Antes disso, em 92, eu tinha feito um curta, Os calangos do Boiaçu, documentando o trabalho dele no rio Branco, em Roraima.

RMB - O cinema brasileiro está numa fase de namoro com a música popular. Vários filmes foram lançados, nos últimos anos, enfocando intérpretes e compositores. Você sentiu que era hora de filmar Um Homem de Moral ou é um projeto antigo?

Ricardo Dias - O filme de agora, Um homem de moral, começou com o registro que eu fiz das gravações da caixa de CDs Acerto de contas de Paulo Vanzolini, em 2002. Gravei o espetáculo de lançamento do CD em 2003 e o projeto foi evoluindo até chegar ao filme que é lançado agora. Gosto de pensar que eu esperei a hora certa para fazer o filme sobre o lado compositor do Paulo Vanzolini.

RMB - A importância da obra de Vanzolini é incontestável. O homem continua produzindo?

Ricardo Dias - Na música não mais. Sua última composição é Quando eu for eu vou sem pena, que o Chico Buarque canta no filme. Na zoologia ele ainda eventualmente dá alguma palestra e orienta o trabalho de colegas.

RMB - Vanzolini tem uma personalidade forte, emite opiniões bem duras sobre tudo. O que ele achou de Um Homem de Moral? Foi fácil trabalhar com ele?

Ricardo Dias - Ele me disse que gostou muito. Mais do que isso, ele me conhece bem e, de certa forma, sabia que tipo de filme eu faria. Para mim sempre foi muito fácil trabalhar com ele e me orgulho muito da confiança que ele tem em mim.

RMB - Pessoalmente, você tem predileção por alguma canção ou algum momento do filme?

Ricardo Dias - O Vanzolini, eu sei que ele gosta muito da participação do Paulinho Nogueira com Valsa das três da manhã, em que ele e o bandolinista Izaías se apresentam maravilhosamente. Paulinho Nogueira era amigo de infância do Vanzolini e morreu pouco tempo depois do espetáculo.

Eu gosto muito de Valsa sem fim, com a Virgínia Rosa, pois o momento que está no filme foi a primeira vez que eu ouvi a música e aquilo me marcou.

Outro momento especial é o Martinho da Vila cantando Juízo final. Deu tudo certo; a luz do estúdio no Rio estava ótima, ele acertou de primeira, foi tudo em um take só, e a edição do meu montador Marcello Bloisi é perfeita.

RMB - Sobrou material, ficaram coisas de fora da edição final?

Ricardo Dias - Sempre fica, mas o que está no filme é resultado de um longo trabalho de depuração. Acho que a gente fez como o Vanzolini, que pode demorar seis meses para escolher uma palavra, como em Boca da noite, ou 25 anos para fazer uma letra, como em Pedacinhos do céu.

Nos extras do DVD teremos o Antonio Candido fazendo a análise de Cravo branco. Também a história de Carybé em Nova Iorque, que era longa demais para estar no filme.

RMB - Você é um documentarista de carreira, com vários títulos no currículo. Pretende voltar ao universo da música popular em próximos trabalhos?

Ricardo Dias - Eu sou cineasta. Fazer documentários é uma contingência, mas admito que eu gosto muito de fazê-los. Já dirigi filmes de ficção em parceria com o Inácio Zatz. Um dos projetos que eu tenho é Maluco Beleza, um filme musical que acontece no universo da idolatria ao Raul Seixas.

RMB - Dê umas dicas pros leitores da RMB sobre bons documentários sobre música brasileira que você assistiu!

Ricardo Dias - Aqui eu dou a dica do meu mestre Paulo Emílio Salles Gomes: Todo filme brasileiro merece ser visto. Assistir os filmes recentes sobre música é sempre bom. Eu recomendo um filme que talvez tenha sido subestimado, O Poeta da Vila do Ricardo van Steen, que é muito bom.

Recomendo também, os filmes sobre música brasileira do Humberto Mauro que fazem parte da coleção da Funarte. É sempre bom valorizar os clássicos.