Revista Música Brasileira

Dentre os vários lançamentos do ano que passou, um dos mais interessantes foi esta inusitada reunião das cantoras Jussara Silveira, Rita Ribeiro e Teresa Cristina (Três Meninas do Brasil, Biscoito Fino, 2008). Donas de carreiras estabelecidas e de repertórios cheio de personalidade, é surpreendente como conseguiram configurar um universo comum de canções de variada extração, mesclando obras de vários períodos e origens.

A faixa-título, um das mais felizes da lavra de Moraes Moreira, em parceria com Fausto Nilo, abre o disco com muita propriedade. As três meninas dividem os vocais, alternando estrofes e mostrando que as diferenças de timbre acabam incorporando novas texturas à canção.

A partir daí, solam algumas faixas ou se revezam em vocais de apoio, duetos e trios. Na direção musical, o craque Jaime Além. E um punhado de belezas vai se revelando nas canções de Tom Zé (Menina Amanhã de Manhã), Paulinho da Viola (Para Ver as Meninas), Sérgio Sampaio (Maiúsculo), Caetano Veloso (Dama do Cassino), Roque Ferreira (Chula Cortada), Zeca Baleiro (Minha Tribo Sou Eu), Dominguinhos (Isso Aqui Tá Bom Demais), Zé Ramalho e Otacílio Batista (Mulher Nova, Bonita e Carinhosa...), Aloísio Ventura (Maria, Mariazinha), Marisa Monte, Nando Reis e Carlinhos Brown (Seu Zé). Teresa Cristina interpreta também a sua "Cantar", para delírio da platéia.

Um momento cheio de brejeirice é a fusão de "Na Cabecinha da Dora", do grande compositor maranhense Antonio Vieira, com a clássica "Nega do Cabelo Duro", de David Nasser e Rubens Soares. Canções de um tempo onde o politicamente correto não havia imposto sua padronização, e que as cantoras reinterpretam com indisfarçada alegria.

Essa mesma saudável atitude de dissolver fronteiras faz com que interpretem um sucesso do Trio Nordestino (Homem de Saia), com letra maliciosa e divertida (“Só dava muié, só muié que dava...”). Arriscaram alto, e aqui derraparam um pouco. As vozes em uníssono soam mais como um karaokê de periferia. O que, para alguns, não deixa de ter certa graça.

A faixa de encerramento é uma faixa recuperada pelos Tincoãs, dos anos 60 (Deixa a Gira Girar), um ponto de terreiro. De certo modo, unifica a tecnomacumba de Rita, a matriz afro de Teresa Cristina e a baianidade de Jussara, mas é anticlimática. Dá a impressão de que se o CD iniciasse com essa faixa e terminasse com Meninas do Brasil soaria melhor.

O show foi gravado no Teatro Municipal de Niterói, e também virou DVD, com faixas extras, que incluem Marcio Greyck (Impossível Acreditar Que Perdi Você), Dorival Caymmi (Lá Vem a Baiana), mais Caetano (Nu com a Minha Música), Chico Buarque e Vinicius Cantuária (Ludo Real) e Gilson de Souza (Pôxa).

O encontro demonstra o grau de maturidade artística que as jovens cantoras atingiram. Um registro que não almeja a perfeição, mas tem gosto de verão, e pode durar por muitos verões.