Especial

Plinio Marcos e o samba paulista

Por Daniel Brazil - 11/06/2012

Aparece tanta gronga, boiando nas águas barrentas em que navego contra a maré, que meu patuá de fé e de valia já anda até entortado.

Com essas palavras o dramaturgo das quebradas do mundaréu, Plínio Marcos, subia ao palco em 1973 para apresentar com sambistas de São Paulo. Também com elas o crítico Fausto Fuser saudou, nas páginas da Folha de SP, o espetáculo que unia, em plena ditadura, o censurado Plínio e os marginalizados compositores Geraldo Filme (1928-1995), Toniquinho Batuqueiro (1929 - 2011) e Zeca da Casa Verde(1927 - 1994).

O espetáculo misturava piadas, causos e sambas, e driblava a censura pesada do período. Plínio tinha várias obras proibidas, mas o texto ali era meio improvisado, em cima da malandragem e da cultura popular.

Dirigido por Emílio Fontana, o espetáculo jogou luz sobre um tipo de produção musical que andava fora da mídia. São Paulo havia se tornado a terra dos festivais, dos músicos pop, berço da nova MPB, e relegava seus sambistas de raiz ao anonimato. A matriz carioca-baiana era mais influente no samba, como é até hoje, e os nomes que se destacavam nacionalmente eram apenas Adoniran Barbosa e Vanzolini.

Plínio Marcos em Prosa e Samba apontava para outra direção. Para um samba negro paulista, de netos de escravos, que lutavam para manter a tradição em suas comunidades, nas escolas (de samba), nos quintais, engenhos e subúrbios. É bom lembrar que o dramaturgo já havia escrito peças onde a música cumpria função destacada, como Balbina de Iansã, e Os Pagodeiros, encenados no Teatro de Arena.

Os três sambistas haviam participado desses espetáculos, havia uma camaradagem entre eles. Quando a censura apertou, e qualquer texto de Plínio Marcos era imediatamente proibido, surgiu a ideia de um espetáculo apenas musical. Plinio seria uma espécie de mestre de cerimônias, e os bambas mostrariam seu repertório.

O espetáculo fez sucesso e foi gravado. Lançado em 1974 pela Continental, com tiragem pequena, não alcançou sucesso nas rádios e virou preciosidade para colecionadores.

Agora, em 2012, depois de muitos anos fora de catálogo, o CD é relançado com o selo Warner, pelas mãos do garimpeiro Charles Gavin. O CD traz texto de apresentação de Tárik de Souza, e pretende ser lançado em shows especiais, com músicos contemporâneos.

Dizer que é histórico é pouco. É indispensável na prateleira de qualquer amante da boa música brasileira. Belos sambas, gravados num espetáculo que virou símbolo de resistência popular numa época de sufocante falta de liberdade.