Especial

Padeirinho, um mestre da Mangueira

Por Daniel Brazil - 29/10/2009

Padeirinho (1927-1987) é um nome lendário do samba carioca. Mangueirense da velha guarda, é lembrado através de relatos e memórias de seus contemporâneos. Sua obra é pouco conhecida fora dos círculos dos amantes do samba, mas teve intérpretes do porte de Jamelão, Germano Mathias, Gilberto Gil, Nara Leão, Jards Macalé, João Nogueira, Clementina de Jesus, Candeia, Noite Ilustrada, Leci Brandão, Xangô, Elza Soares, Nilze Carvalho, Jorge Aragão e Paulinho da Viola, entre outros. É mole? Você certamente já ouviu músicas de Padeirinho e não sabia que era dele...

O autor de Favela (“Numa vasta extensão/ onde não há plantação/ Nem ninguém morando lá...”) morreu antes de gravar seu primeiro disco. Considerado um dos grandes da ala de compositores da Mangueira, nunca atingiu o reconhecimento midiático de um Cartola, Nelson Cavaquinho ou Nelson Sargento, com quem conviveu.

A expressão “zé mané”, que hoje qualquer zé mané utiliza, foi registrada por ele, de forma pioneira, em Linguagem do Morro, lá nos anos 60. Beth Carvalho repôs o samba em circulação, em 1996, no disco Brasileira da Gema, e a gíria pegou. Quer dizer, chegou ao asfalto, porque no morro ela nunca deixou de ser marca registrada.

Considerado um inovador da linguagem do samba, com gírias e harmonias inusitadas, a obra de Padeirinho pode ser vista agora em toda sua vasta extensão. Outro mangueirense do caroço, Devani Ferreira, mais conhecido como Tantinho, resolveu fazer justiça ao mestre e acertar as contas com a História. Pesquisou, selecionou, batalhou um patrocínio da Petrobras Cultural e gravou 14 sambas de fina extração.

O sambista-intérprete já havia gravado em 2006 o belo Memória em Verde e Rosa, CD duplo com obras de autores mangueirenses, edição patrocinada com apenas 3 mil exemplares. Quem tem, sabe que vale ouro. Prêmio Tim de Melhor Disco de Samba em 2007 e coisa e tal. O fato desta gravação não ter distribuição comercial é algo assim com um crime de lesa-cultura.

Tantinho é nascido e criado no morro da Mangueira, e com seis anos já assumia um posto na bateria-mirim da escola. Com treze foi admitido na ala dos compositores. Corria o ano de 1959, e seu nome teve o aval do próprio Cartola. A primeira grana que ganhou com música foi defendendo justamente um samba de Padeirinho no programa do Chacrinha, na rádio Mayrink Veiga.

Está claro que aqui não há lugar pra amador ou sapo de fora. O samba rola com a força da tradição, elegante, bem arranjado, bem tocado e bem cantado. Artes de Paulão 7 Cordas, craque reconhecido como um dos grandes responsáveis pelo melhor samba da década. Com o apoio de grandes músicos da cena carioca, os naipes de sopro e cordas calçam a voz firme de Tantinho com o fino couro de quem sabe como deve ser a pisada

O disco traz a participação especial de Mestre Birinha, filho mais velho de Padeirinho, em duas faixas. Outro filho, Bira Show, participa da percussão, com mais dois netos do compositor. Moacyr Luz abre alas para O Remorso Me Persegue, que já havia gravado no excelente CD Na Galeria, de 2001. Tantinho ainda registra quatro composições inéditas, pra não deixar qualquer dúvida de que este é um dos principais lançamentos de 2009. Um grande ano para o samba, por sinal!