Especial

Dorina – Violões e Emoção

Por Áurea Alves - 30/07/2007

O subúrbio carioca possui uma identidade própria, única e especial que trata com orgulho suas origens. Sem nunca perder a característica de manter tradições e ainda de promover misturas e entre novo e antigo A gente suburbana é alegre, festiva e unida, e suas relações são marcadas pela extrema emoção, suficientes para promover manifestações significativas para a cultura do País.

É desse meio que surge a cantora carioca Dorina, cuja carreira tem sido devotada ao samba, notadamente aquele que se mantém vivo nas rodas, especialmente as suburbanas, como as do Cacique de Ramos, onde Dorina definiu sua opção musical. Tendo se apresentado por todo o Brasil e no exterior, nunca negou sua essência e isso faz dela uma intérprete de referência para quem aprecia o ritmo nacional. Dorina é sambista, com toda a importância e excelência que esse termo carrega.

A música é a substância da qual ela se incumbe em traduzir a essência: a originalidade das rodas de samba, a herança das velhas-guardas e a reverência aos grandes compositores. É o que comprova seu mais recente trabalho, o disco O violão e o samba em que, pela primeira vez. a cantora adota o modelo violão e voz, acompanhada por Carlinhos 7 cordas e Cláudio Jorge. O formato escolhido poderia cair na vala comum de interpretações similares, porém ganha destaque pelo fato de reunir violonistas importantes, um repertório de qualidade e a melhor cantora de samba, cuja voz se realça em perfeita harmonia com os instrumentos. Os arranjos são de Carlinhos e Cláudio, mas é Dorina quem conduz e assegura o andamento, imprimindo a cada música sua marca pessoal de interpretação.

Samba de Irajá abre o disco como se fosse uma oração dando início aos trabalhos, numa interpretação em que a cantora afirma sua condição de suburbana – com todo o orgulho – e deságua seu coração em uma interpretação sincera e emocionada. Nas demais faixas a cantora expõe suas influências, notórias como Elizeth Cardoso, sem perder sua própria característica, a de intérprete da alma. A mesma que se manifesta na interpretação de músicas da autoria de grandes nomes do samba, como Arlindo Cruz e Sombrinha, Bide e Marçal, Nei Lopes, Moacyr Luz, Luiz Carlos da Vila, Cláudio Jorge, Candeia, Paulinho da Viola e Cartola. Ao lado destes, nomes da MPB Baden Powell, Chico Buarque e Sidney Miller.

O repertório foge à obviedade do tema, apresentando sambas como Zuela de Oxum (Moacyr Luz e Martinho da Vila), Violão Amigo (Bide e Marçal) e as perfeitas Cordas de aço (Cartola) e Meu violão (Sidney Miller). Em todas o conjunto da interpretação, o envolvimento da cantora, associado à execução perfeita dos violonistas, produzem sensações distintas, sempre centradas na emoção que está presente nas músicas e que ela se encarrega de evidenciar. São, sobretudo, sambas, belos exemplares da Música Popular Brasileira em um trabalho que merece ser registrado desde já como um dos melhores do ano.

Os fãs das rodas não devem se preocupar quanto a uma possível guinada mais intimista na carreira de Dorina, algo improvável. Esse trabalho apenas aponta um outro norte para a interpretação do samba, não deixando de lado, porém, a origem, o que transparece na escolha do repertório, pronto para ser interpretado em meio a tantãs, cavaquinhos e pandeiros sem perder a sensibilidade da voz dessa grande cantora que sempre pertencerá ao samba, em primeiro lugar.