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Vander Lee ou Ly, eis a não-questão

Por Marcio Paschoal - 21/08/2006

Conheci Vander Lee em meados do ano 2000, apresentado pelo letrista e poeta Sérgio Natureza, que, dele falava maravilhas. Ouvindo seu disco, supostamente de estréia, “No balanço do balaio” (Kuarup), não só comprovei o que me dissera Natureza, como também fiquei bem impressionado com a sua verve e ritmo. O lado autoral se destacava, prenunciando o artista que logo viria a ser descoberto, saudado como revelação e solicitado pelas estrelas cantantes da MPB.

Dele falei, à época, que havia chegado um compositor mineiro, de jeito bem quietinho, com melodias ricas. No samba malandro “Passional”, um fiel retrato do bom humor de suas letras, um passista sente ciúmes da sua porta-bandeira e avisa que não é de violência mas poderá perder a cabeça uma hora dessas: (“Rolavam Noel, Cartola, Paulinho da Viola e coisa e tal / mas ela pôs um balde de água fria no meu carnaval / girando feito donzela, nos passos do meu rival / eu que não sou de balela, fiz um samba passional”). A auto-referencial “Românticos” foi a melhor faixa, disparado. Uma balada cuja letra assegura que os românticos são loucos e poucos, e que pensam que o outro é o paraíso. Poesia e música envolventes.

Quando ainda estava em estúdio, gravando seu terceiro trabalho, a cantora maranhense Rita Ribeiro (uma das primeiras a gravá-lo) me mostrou a faixa com a balada “Românticos”. Ali, disse a ela, essa escolha é tiro certeiro. De fato, Rita ajudou a firmar o nome do compositor Vander Lee.

Um detalhe, no entanto, passou-nos despercebido, a nós e, acho, à grande maioria: não era a estréia dele, e sim seu segundo disco. Antes já gravara o cd independente “Vanderly”. Isso mesmo, Vanderly!. Assim, com esse pseudônimo artístico ?! começou sua carreira. Ele renega o disco, autêntico filho bastardo. O próprio Vander explica: “Havia músicas boas no disco, mas eu não soube concebê-las. Não me sinto representado por ele. Era um disco demonstrativo, um cartão de visitas para as gravadoras. Nunca pensei em torná-lo acessível às pessoas. Eu não tinha maturidade suficiente. Foi um disco que serviu para me ensinar como não fazer. Todo artista tem um trabalho que abomina. Decidi mudar a grafia do meu nome”.

O disco é mal produzido e precário, mas traz as originais “Quem me dirá?” (regravada no Balaio), a badalada “Contra tempo” e “Atriz” (regravada no cd “Naquele verbo agora”, Indie Records). Aliás, neste disco, o mais bem divulgado do artista, há o registro da ótima “Iluminado” e da delicada “Meu jardim”, sem contar a recorrente na rádio, “Breu”.

Contrariando o esperado, ouso destacar a quase canção de ninar “Rastro”, que, mesmo com rimas um tanto óbvias (“subo o mastro, procurando o rastro / busco teus sinais em que ilhas/ em que plano brilhas/ como e onde estás”) mostra o seu velho manancial melódico.

É aguardado para breve novo disco desse mineiro com voz suingada e dono de melodias hipnóticas que conquistaram tantos admiradores. Espera-se que ele arrisque mais e saia dessa perigosa “marca registrada” de baladas românticas e melosas, quase pseudoboleros. Vander tem mais cacife para mostrar.

Agora, no que diz respeito à escolha de pseudônimos, depois do infalível Bruce, da mutante Rita e da calça jeans, adotar Lee ou Ly é irrelevante.