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Os sonetos do compositor

Por Marcio Paschoal (*) - 16/01/2015

Pouca gente conhece o lado sonetista do grande letrista da nossa música popular, Paulo César Pinheiro. Um mestre na escolha certa das palavras, artesão de precoce empenho (começou a escrever sonetos com quinze anos) PC Pinheiro lança, pela editora 7Letras, seu primeiro livro desse gênero: “Sonetos Sentimentais pra Violão e Orquestra”.

PC pode se incluir na lista dos recordes como um dos maiores autores (se não o maior) de música popular: são quase duas mil composições, sendo 1.300 gravadas por todo o time de craques da nossa MPB. Um número que impressiona, acredito eu que até ao próprio autor que se autonomeia um “escravo das emoções humanas” e trabalha com disciplina notável e sem parar há mais de 50 anos. É seu oitavo livro (antes, quatro de poemas, dois romances e um de contos) com sonetos que descrevem toda a gama de emoções, indo do amor maluco ao ciúme impiedoso, sempre tangenciando limites e rasgando a pele, flertando com a solidão e o desespero dos parceiros e amantes, enfim, revelando um rosário de situações e possibilidades no batido confronto entre emoção e razão (com esta última sempre cedendo, bom que se diga).

O autor prefere captar o cotidiano simples dessas paixões desenfreadas, alucinadas, que montam e desmontam o coração humano. Podem ser céticos ou apologistas acalorados do sentimento amoroso, mas sempre chega a hora de se acertar uma conta. E a sensibilidade e a marca do autor imperam.

Dos sonetos que prefiro, o que exatamente fecha o livro e conta a saga da caneta do poeta (PC escreve todos os seus textos à mão), fiel companheira, uma caneta preta que fica no fundo de uma gaveta, testemunha dos contos de sua vida, vida esta de que não levará nada consigo, nem no jazigo, além do que foi deixado no legado da sua tinta.
Pode-se a princípio imaginar um livro que reúna possíveis e futuras letras de música. PC não descarta (um dos sonetos do livro até foi musicado por Dori Caymmi: “A Lua”) mas sua concepção original foi literária. Como o poeta convive e respira música, seus sonetos têm a sonoridade e podem se transformar em futuras canções, certamente.
Profícuo escritor, compositor há muito requisitado pelas maiores divas (Clara, Elis, Bethânia etc), PC garante que ainda tem muita coisa guardada e muita ainda por escrever.

A boa poesia, então, pode ficar tranquila pois há ainda bastante munição e surgirá como numa estrela guia, clarão de lua quando serenar. Aliás. “Viagem”, dele e João Aquino, um de seus clássicos, não vê tipo nem preconceito, gravada tanto por Nelson Gonçalves quanto Bruno e Marrone. O importante é a tal emoção. E assim segue o escritor, artífice das palavras sonoras, solenes ou mágicas, se emocionando com o que cria e emocionando quem o lê.

(*) escritor , autor da biografia de João do Vale