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Duofel pulsando MPB

Por Marcio Paschoal - 07/05/2013

Positivamente não é um disco comercial. E o positivamente aqui é empregado no melhor sentido literal. O cd “DuoFel pulsando MPB” dos violonistas Fernando Melo e Luiz Bueno, não pode mesmo visar ao sucesso fácil, ao entendimento automático. Desprovido de maiores tecnologias e apegado à prática de um esmerado preparo artístico, a dupla explora agora o universo de algumas canções já bastante conhecidas e de compositores consagrados. Não, não é comercial, mas pode-se ouvir com carinho e sem receio. Além de uma certa ponta de orgulho. Não é um disco de modismos, muito menos de tendências.

Num estúdio pequeno, dois artistas ensaiam na busca de algo perto da perfeição. Mas, sabedores de que esta não existe, satisfazem-nos com a tentativa.

Assim acontece na abertura com o medley, se aceitarmos o nosso americanismo, ou pout-pourri , se nos lembrarmos que há bem pouco eram os franceses a quem copiávamos. Não importa: temos três canções do Chico, a saber, Construção/Cotidiano/Deus lhe Pague, em arranjo baseado nos violões de aço e afinações diferenciadas com resultado aparentemente monocórdio. Mas enganam-se os que julgam como repetição banal. No DuoFel rareiam as obviedades. Tudo é notório, surpreendente e admirável. Não é um mundo novo huxleyniano, mas inventa um bocado.

“Água de beber”, de Jobim e Vinícius, passeia pelos acentos do violão e deixaria o mestre Heraldo do Monte feliz.

“Romaria” de Renato Teixeira, clássico caipira, recebe um tratamento que comove pela singeleza. Não podia ser diferente.

Já a técnica de Baden é revisitada, com o auxílio das cordas de aço em arco de violino, na ótima “Acalanto das Nonas”.  

Fernando e Luiz procuram retirar dos violões a sonoridade mais exata, embora esta não soe meio matemática, meio obra de partituras cansadas. Procuram um som de nylon, dissonantes calmas, rabecas inventadas e o contrabaixo a emoldurar os solos. “Dindi” (Jobim e Aloysio de Oliveira) é assim. Uma das melhores faixas.

Estranho, mas este duo se locupleta quanto mais as obras parecem esgotadas. Retiram leite de pedras sonoras. “Disparada”, de Vandré e Theo de Barros, não alcança os mesmos efeitos, mas não deixa de empolgar. Tem “Procissão” (Gil e EdyStar), “Urubu Malandro”(Lourival Carvalho e João de Barro e “Casa forte” (Edu Lobo) num repertório de bom gosto e nem tão eclético assim.

O DuoFel é resultado de mais de 30 anos de estrada, incluindo pesquisas, ensaios e shows diversos. O paulistano Luiz Bueno e o alagoano Fernando Melo, autodidatas, são responsáveis por alguns dos melhores arranjos da nossa boa música instrumental. Seu cd de 2010, visitando a obra beatle, fez algum barulho e mostrou aos neófitos como se faz uma canoa. A receita se repete neste disco bem trabalhado e que, repito, se não é comercial, deveria sê-lo.  No melhor bom sentido, claro.

 

(*) Marcio Paschoal é escritor, autor da biografia de João do Vale