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As canções de Moisés Gabrielli

Por Daniel Brazil - 31/01/2011

Vida de músico tem dessas coisas. O cara domina o instrumento, começa a fazer arranjos, organiza bandas, grava em estúdio, acompanha cantores e cantoras, faz bailes e carnavais, torna-se conhecido no meio. Mas continua desconhecido do grande público.

Aí dá aquela vontadezinha de fazer um trabalho autoral. Algo onde possa registrar sua voz e suas composições, juntando os amigos músicos e abrindo outras parcerias. E o resultado muitas vezes revela facetas inesperadas, capazes de surpreender o ouvinte.

Moisés Gabrieli é um desses. Graduado em composição e regência pela UFBA e baixista por opção, tocou em várias bandas baianas, entre elas a Banda Eva. Gravou com Daniela Mercury e foi diretor musical de Ivete Sangalo por dez anos. Sem pressa, como bom baiano, foi preparando as canções que mostra agora em Canções do Nordeste. Gravado durante o ano de 2010, o CD foi patrocinado pela Vivo e pelo Governo do Estado da Bahia, escolhido entre outros projetos.

Moisés aborda a poética nordestina em suas múltiplas formas, como afirma no texto do encarte. Mapeia todas as influências, do baião até o samba de roda, do maracatu ao frevo, das emboladas e repentes até as toadas urbanas, e traduz de forma pessoal, com a colaboração de vários parceiros. Tocando violão (às vezes baixo), cantando, arranjando e regendo, apresenta um conjunto equilibrado de canções, tocadas e gravadas com apuro.

Com parceiros como Luciano Souza, Carlos Pitta, Galvão, Jaime Sodré e Jorge Alfredo, as canções descrevem a paisagem do São Francisco, a vida do campesino, o encanto da vida familiar e, claro, o amor. Ora alegre, como em Mistura Gostosa (parceria com o grande Roque Ferreira), ora terno como em Flor do Mandacaru (com solo lírico da filha Ella), Moisés mostra seu domínio sobre o a arte de fazer canções.

Mas é nas duas últimas faixas, instrumentais, que ele mais brilha. O baião jazzístico Então Tá! e o frevo Ladeira do Sol, ambos em parceria com baterista Chico Sá, são irresistíveis, cheios de suingue e invenção.

Certamente este é um caminho para outros talentosos músicos de apoio que anseiam por mostrar um trabalho solo. Abrir novas sendas na música instrumental brasileira, com a sabedoria artesanal de Moisés Gabrielli.