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A asa sonora de Gustavo Galo

Por Daniel Brazil - 25/07/2014

A Trupe Chá de Boldo é um divisor de águas na moderna música brasileira. Um grupo de jovens músicos que não despreza o rico passado musical brasileiro, e que mistura marchinhas e boleros ao rock de ecos tropicalistas, além de recuperar a herança da Jovem Guarda no que ela tem de melhor. Letras originais, frescor temático, diálogo com várias estéticas. Tudo-ao-mesmo-tempo-agora, com boas pitadas de poesia marginal e cultura alternativa, sem parecer pretensiosa ou fundadora de alguma seita.

Um de seus membros mais destacados, o cantor e compositor Gustavo Galo, lançou em 2014 seu CD solo, Asa (baixe aqui: http://www.gustavogalo.com/). Alternando baladas e faixas mais pesadas, Galo conta com o apoio de um belo time de participações especiais: Mauricio Pereira e Alzira Espíndola (Tomara), Ava Rocha (Asa), Lirinha (Nosso Amor É uma Droga), Lucinha Turnbull (Um Garoto), Tatá Aeroplano (Só), e mais um punhado de músicos da nova geração. Tatá é também um dos produtores do disco, junto com Gustavo Ruiz.

Uma pista para entender a herança poética de Gustavo Galo está na homenagem a Walter Franco, com a regravação de Eu Te Amei Como Pude (Feito Gente). É bom prestar atenção nas letras despudoradas, onde intimismo, ironia e sinceridade se mesclam, ignorando fronteiras entre os temas ditos “nobres” e os pequenos (tornados imensos) incômodos cotidianos de um jovem urbano-universal. Aqui e ali são citados Patti Smith, Clementina, Rita-Zeca-Cauby-Mutantes, Leonardo Cohen e Noel Rosa. Subentendidos estão outros bardos, como Tom Zé, Gil ou Caetano.
É um belo exemplo de poética da MPB contemporânea, marca de uma geração que não se organiza como “movimento” (expressão sessentista muito usada nas décadas seguintes), mas que apresenta diversos pontos em comum. Hoje se diz “cena”, o que não é exatamente a mesma coisa.

Para onde vai a moderna MPB? Tal qual uma árvore que se ramifica em múltiplos galhos, não há uma resposta única. Crescerá em todas as direções, diria um jardineiro experiente. Seja lá que aspecto terá a futura paisagem, Gustavo Galo e a Trupe Chá de Boldo estarão presentes, derrubando paredes e marcando sua posição. Galo é um legítimo representante desta nova poesia que brota das rachaduras das canções: “Enterrei meu coração numa praça (...)/ Tomara que nasça”.